quinta-feira, 23 de abril de 2015

Entre o medo e a coragem



Cheguei no quarto da pousada uma da manhã, um dos lugares mais desertos que vivi, sempre foi tão distante que nunca me causou grandes preocupações. Estacionei o carro e entrei sem medos e imaginações, no local não há vigias, apenas cerca e o muro um muro baixo. Os ventos são fortes, como de costume em regiões serranas, estava tudo escuro, há lâmpadas apenas nos portões, porém, a área da pousada é muito extensa em relação aos pontos iluminados. Entrei, a chave do prédio fica escondida, nada me atordoava. Quando cheguei no quarto tomei uma dose de conhaque e verifiquei as minhas anotações, o dinheiro era bem contado, gostava de planejar meu dia seguinte todos os dias antes de dormir. Não pegava no sono, são raros os momentos em que tenho dificuldade de dormir, escutei um barulho alto no quarto do lado, era meu amigo que tinha ido dormir com o rádio ligado e a luz do quarto acesa, ele assim como eu, era um batalhador em busca de uma vida melhor. Peguei no sono também, e retornei a acordar umas  três horas da manhã, fui beber água na parte de baixo da pousada, nunca tive medo de andar sozinho nos corredores velhos do estabelecimento, mas naquele dia tive algum tipo de medo, algum pressentimento ruim, dessa vez pensei realmente na possibilidade física de alguém entrar no meu quarto naquele momento, cada objeto perdido por ali parecia alguém me olhando, escondido. Desprezei esse sentimento e fui dormir. De certa forma eu estava sempre meio dormido e meio acordado, mas peguei no sono. 

De repente meu amigo do quarto ao lado começa a gritar pelo meu nome e pelo nome da dona pousada:
- Ulisses, Ulisses, Dona Margarida, Dona Margarida...
Eram gritos muito fortes e altos, então ele começou a bater com muita força na porta do meu quarto, e sempre dando continuidade aos gritos. Fiquei espantado e acordei com o coração acelerado, cheguei a pensar que ele estava rendido, que alguém o estava fazendo de refém e queria entrar no meu quarto também, mas verifiquei a porta e percebi que se alguém de fato quisesse entrar, bastaria arrombar a porta:
- Ulisses, alguém entrou no meu quarto a noite e roubou meu pagamento e meu relógio enquanto eu dormia.
Os olhos dele eram de terror. Sua estrutura física forte e esbelta fora desmoronada pela sensação de vulnerabilidade. 
- Ulisses, poderiam ter me matado, você tem noção do que esse bandido poderia ter feito comigo.
Sempre tivemos uma amizade horizontal, percebi que naquele momento eu representava algum símbolo de segurança para ele, pois ele parecia um bebe desesperado, a verdade era essa, um bebe. Tentei acalmá-lo, mais era impossível,desceu até a recepção e  tentou ligar para um tal de Rogê  amigo dele, em plena quatro horas da manhã, estava sem noção. Naquele momento me perguntei o que de tão sagrado para ele havia sido violado. Ficou por momentos carente, procurando ligar para a namorada, irmãs, etc.  Naquele momento tive a impressão que tomou a dona da pousada como sua mãe, Dona Margarida se tornou por um momento a sua mãe, ele não desgrudava dela, e o tempo todo pedia que ela não o deixasse só, fiquei impressionado. 
- Dona Margarida não sai de perto de mim por favor. 
A Policia foi chegando, ele aos poucos foi se acalmando e o dia foi nascendo. As oito da manhã, já era novamente forte e vingativo, prometera a se mesmo se aliar a Policia e pegar o autor do furto...