sábado, 31 de agosto de 2013

Pião de trecho--- Capítulo 11 (final)- O passar dos anos

Mal Pedro concluiu sua primeira obra em Cubatão e já havia outra para ir no interior do Pará, e depois em Minas Gerais e foi também ao Rio Janeiro e ao Brasil ele passou e pertencer.... Carine suportou esperançosa que Pedro desistisse daquela vida por dois anos, depois desse tempo ela não se separou, mas também passou a ter uma vida paralela. Continuou uma mulata bonita e atraente, sempre que podia deixava as crianças com a mãe e inventava uma desculpa para ir a Salvador passear, fazer cursos, etc. E ali ela se interessava por outros rapazes assim como Pedro se interessava por outras garotas. O casamento passou a ser praticamente uma fachada, o único motivo que unia os dois e os mobilizava de verdade era quando ocorria algum problema com os filhos. Gabriela cresceu e se tornou uma menina desobediente, a verdade é que Carine não podia com ela, a menina sentia uma espécie de raiva e amor a todos os homens, talvez o preço de uma referência masculina ausente de sua vida. O único que ela respeitava de verdade era Israel, primo de Pedro, quando este lhe dava broncas ela se comportava e lhe escutava, ele tinha um carinho muito especial pela sobrinha. O respeito que ela tinha por Pedro ela confuso, ela sabia que aquele homem lhe originara a vida, mas sua intuição feminina desde pequeninha entendia e processava tudo, o vazio que o pai deixava em casa e solidão da mãe, lhe remetia a um ódio inconsciente do pai... uma mistura de amor e ódio que mais tarde iria refletir nos seus relacionamentos com os homens. Já Tiago de certa forma achava o máximo a luta do pai, talvez os primeiros nos de sua vida em que Pedro passeava com ele na beira do rio, lhe permitiu um respeito e um vínculo eterno com o pai. Ele foi crescendo e onde estivesse procurava falar com Pedro todos os dias.
As vezes que Pedro ia para casa praticamente só falava em toneladas de tubulação a serem montadas. Tirava um tempinho sim para falar com Carine e saber dos filhos. Por um lado ele sentia um orgulho imenso, pois não faltava nada em casa e os dois filhos eram bons alunos na escola.
Quinze anos se passaram, em 2009 Pedro já era encarregado de Solda e no trabalho seguia o exemplo de Ulisses. Carine era dona de um salão de beleza. Tiago cursava o terceiro ano em Salvador e Gabriela ainda estudava em Cachoeira.
14 de Dezembro de 2009, Aeroporto de Salvador
Lá estava Pedro rumo a Coari interior do amazonas, ali seriam construídas duas estações de compreensão para aumentar o abastecimento de Gás em Manaus.
- Pedro, você sabe quantas toneladas de tubulação serão montadas?
- 400 toneladas de aço carbono mais 250 de inox.
- Como é que está a distribuição de firmas nesse consorcio?
- A TDK é a dona da obra e a Ticna Engenharia está com o projeto, a parte de civil é da Proenegem Engenharia.
- Muito bom....
Já esperava o horário do avião como se aquilo fosse pegar um ônibus. Então o celular tocou:
- èe passou... passou... tá na lista....
- Como? – disse Pedro- Não entendi.
- Passou... O Tiago passou para Engenharia Civil nas cotas, sou eu Carine. O Jeremias tá reservando o boi e o churrasco.
Naquele momento Pedro como de costume pensou em suprir sua ausência dizendo que ia transferir o dinheiro da festa para Jeremias, o dinheiro pela presença, como tinha feito nos últimos 15 anos. Mas Tiago pegou o telefone:
- Pai, passei, passei... valeu a pena, todo o sofrimento que passei em Salvador sem dinheiro, obrigado por ter sido meu amigo todos esses anos. Mesmo estando longe, você é meu melhor amigo. Vem para cá!.
Naquele momento as ideias de Pedro tornaram-se confusas, frases como “meu filho Engenheiro Civil” eram disparadas o tempo todo pelo seu inconsciente. As injustiças que ele passara na vida todos aqueles anos trabalhando no trecho. A quantidade de engenheiros mau educados que já suportara para permanecer no emprego. E agora seu filho. Era tudo bem confuso, aqueles anos todos ele trabalhará por um propósito, o futuro dos seus filhos. Lembrou-se de Gabriela e Tiago, e sentiu muito orgulho de uma luta, um sacrifício... pois ele sacrificará a sua vida e a de Carine pelos filhos e este era a primeira vez na vida que tomava consciência disso. Estava emocionado, seu filho ia cursar engenharia civil... uma grande festa estava para acontecer e ele não ia poder comparecer. Então um de seus amigos que acabara de chegar ao aeroporto lhe perguntou:
- Quem é a gerencia dessa obra?
- Ponto final- foi o que Pedro respondeu.
Pegou o celular e ligou para seu superior. Ainda não estava com a carteira assinada:
- Não vou, tenho que resolver uns problemas.
- Só esse embarque.
- Não vou, tenho que resolver uns problemas.
Pegou o celular e ligou para Gabriela:
- Filha, se prepara que eu to chegando aí de surpresa.
Pegou um ônibus até a rodoviária e partiu para cachoeira. No caminho ia olhando para a BR-101 e começou a sentir saudades de sua infância. Só queria chegar em casa e fazer a surpresa que Carine e seus filhos sonharam por tantos anos, aquele era o dia do ponto final. Quando chegou em cachoeira, lá estavam todos no mesmo campo de futebol de anos atrás. Quando ele chegou a alegria de todos era evidente, o dia era de festa. Seu filho jogava em campo e o churrasco não parava de sair. Carine estava um pouco estressada, ela se preocupava com tudo . Pedro olhou tudo aquilo, o rio, a mulher, os filhos... ele tinha um coração bom, ainda estava em tempo de conquistar todo mundo, principalmente reconquistar Carine. Se aproximou dela e depois de muitos anos tornou a ser carinhoso com ela:
- Parabéns pela mãe que você, estou muito orgulhoso de você.
Pedro ainda não sabia como ia ganhar dinheiro, mas era ciente de que ia vencer, seu conhecimento de solda era avançado, isso lhe permitiria arrumar empregos por ali, não tão bem remunerados, mas perto de casa. Queria dizer algo ao filho, como um pai bobo que quer ajudar, mas a única coisa que sabia da faculdade de engenharia era que as matemáticas eram bem puxadas. O sol foi se pondo, ele queria se reaproximar da filha, puxava conversa, Gabriela naquela dia mais que ninguém estava muito orgulhosa do pai. O chefe da obra de Coari tornou a lhe ligar para aumentar a proposta do salário. Mas Pedro nem atendeu. Aquele foi o dia do ponto final.

FIM
Escrito por Daniel Vidigal

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